Imprimir esta página

Mais de 100 mil mulheres tomam Esplanada na Marcha das Margaridas

“Margarida, Margarida, nossa Marcha tem seu nome. É melhor morrer na luta, do que morrer de fome”. Com estas palavras de ordem, mais de 100 mil trabalhadoras do Norte ao Sul do país, do campo e da floresta, deixaram a Cidade das Margaridas, no Parque da Cidade, nesta quarta-feira em Brasília, onde estavam acampadas, e marcharam rumo ao Congresso Nacional, durante a 4ª edição da Marcha das Margaridas.

“As palavras de ordem, que fazem referência à Margarida Maria Alves, presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Alagoa Grande (PB), morta brutalmente, resumem bem o espírito de garra e coragem que tomou a Esplanada dos Ministérios no dia de hoje. Toda esta mobilização encoraja a postura da não passividade e da não submissão”, afirma Deise Recoaro, Secretária de Políticas Sociais da Contraf-CUT.

De acordo com a dirigente, que está em Brasília e acompanha desde ontem as atividades da Marcha, os sindicatos de todo o país atenderam ao chamado da Contraf-CUT e compareceram à manifestação. “Esta é uma grande oportunidade para socializarmos a luta da classe trabalhadora e em particular das mulheres de todo o Brasil. As trabalhadoras rurais têm muito a nos ensinar. Elas estão dando uma verdadeira demonstração de coragem, solidariedade e politização. Merecem todo o nosso respeito”, ressalta Deise, que também está acampada na Cidade das Margaridas.

Deise destacou a importância da luta dos trabalhadores do ramo financeiro para as trabalhadoras rurais. “Um dos pontos da campanha dos bancários este ano é a regulamentação do sistema financeiro. Essa regulamentação pressupõe responsabilidade social por parte dos bancos, que dará possibilidades de acesso ao crédito das classes com menor poder aquisitivo, crédito rural e formas de pagamento que favoreçam o crescimento dessa área”, afirmou Deise.

 

Bancárias presentes

Diretoras e diretores de sindicatos caminharam ao lado das ‘margaridas’, além de participarem das demais atividades que antecederam o evento, como a sessão solene de lançamento da Marcha, realizada na Câmara Legislativa, de iniciativa da deputada distrital Rejane Pitanga (PT-DF). “Valorizamos a luta das trabalhadoras e compreendemos que as reivindicações dessas mulheres também são importantes para a sociedade”, diz Fabiana Uehara, secretária de Saúde e Condições de Trabalho do Sindicato dos Bancários de Brasília.

“As questões de equidade de gênero, saúde e educação de qualidade é bom para todos. As reivindicações dessas mulheres vão além da realidade rural”, completa Rosane Alaby, secretária de Imprensa do Sindicato.

 

Histórias de luta

Maria Delfino e sua amiga Elisafrania sairam do Maranhão, onde lutam pelo pelo direito de acesso à terra. “Nós somos de um assentamento muito humilde e passamos muitas dificuldades. Então, estamos aqui para que a Dilma possa nos ajudar. É muito difícil para nós termos a terra para plantar, pois é muito caro. E mais difícil ainda é não ter estrutura para trabalhar, então vamos ver se a Dilma nos ajuda né”, desabafou Maria Delfino, enquanto seguia rumo à esplanada dos Ministérios.

Debaixo de um sol muito intenso, um trio elétrico animava a caminhada e lembravam ao Brasil a pauta da manifestação. Pontos como o combate à violência contra a mulher por meio da ampliação de recursos para o cumprimento da Lei Maria da Penha, a regulamentação da agricultura familiar como processo fundamental para o desenvolvimento sustentável e a isenção de impostos a toda a cadeia orgânica e agroecológica estiveram presentes no discurso. Além, claro, do eixo fundamental: a reforma agrária.

 

Herdeiras de Margarida

A quilombola e agricultura Severina Luiza da Costa, 43, mais conhecida como Cida, carregava um crachá que despertava atenção. Na identificação de sua origem, o município de Alagoa Grande, na Paraíba, justamente onde Margarida Alves construiu sua trajetória como presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, local antes de ser assassinada, em 1983. Fato que inspirou a criação da Marcha.

Cida ocupa a função de vice-secretária da organização e, como muitas outras pessoas presentes, trouxe ao Distrito Federal uma questão prática: o desejo de cobrar do governo a titulação do quilombo, ação que aguarda há 11 anos. “Margarida foi uma mulher muito lutadora e nos ensinou a lutarmos por nossos direitos.”

Mas, nem só de mulheres é feita a mobilização. Prova disso era Raimundo de Souza, 75, que demorou dois dias e meio para chegar. De fala simples, coisa de matuto, ele trazia um documento para entregar ao ministro da Reforma Agrária. Nele, cobrar o atestado de residência de um sítio. “Foi lá que eu apliquei em 150 hectares de terra e criei meus filhos. Tenho atestado de residência, luz e água, mas ainda não tenho terra.”

 

O sonho que eles sonharam

A parte final da Marcha contou com o discurso de lideranças de movimentos sindicais, de organizações feministas e de parlamentares. Pessoas que direta ou indiretamente estão ao lado dos camponeses. Presidente da Contag (Confederação dos Trabalhadores na Agricultura), Alberto Broch destacou que a mobilização ia muito além da entrega da pauta de reivindicações ao governo. “Fica uma lição de cidadania e a visibilidade às mulheres do campo, que têm dupla, tripla jornadas e produzem a cultura que essa país tem e queremos que preserve. Oxalá essa luta chegue ao Congresso para que sejam aprovados medidas importantes como a PEC do Trabalho Escravo e a reforma política para que mais mulheres possam ter espaço.”

Muito emocionada, a atriz e militante Letícia Sabatella lembrou a origem da luta que as Margaridas, presentes nesta terça no Distrito Federal, empreenderam. “Se hoje estamos aqui para defender direitos mais humanos é porque nós somos hoje o sonho sonhado por tantas mulheres que tiveram seus gestos muitas vezes reprimidos, ceifados e assassinados, mas não tiveram seus sonhos cortados. Nós somos o sonho sonhado de muitas mulheres que vieram antes de nós.”

Secretária do Meio Ambiente da CUT e coordenadora geral da Marcha das Margaridas, Carmen Foro, deixou bem claro qual o modelo de Brasil desejado pelas Margaridas. “Alguns perguntaram se eu achava que havia 100 mil mulheres em Brasília. Eu disse que não, que tinhamos milhões, porque essas que vieram trouxeram na ama o desejo de transformação de todas aquelas que não puderam vir. Todas que foram assassinadas, ressurgiram hoje, portanto, Margarida Alves vive entre nós para dizermos que queremos um país com desenvolvimento, mas que esse desenvolvimento seja social, econômico e também ambientalmentere responsável”, disse.

Já a secretária da Mulher Trabalhadora da CUT, Rosane Silva, lembrou o processo de construção da atividade, nos 27 estados, com apoio das federações filiadas à Central em todo o país. Citou ainda a importância da ampliação da oferta de creches no campo e na cidade como forma de garantir a autonomia das mulheres, além da necessidade do processo de distribuição de renda incluir a ampliação de crédito e a oferta de assistência técnica às trabalhadoras rurais. Por fim, encerrou com uma frase da própria presidenta Dilma. “Nós, mulheres, podemos.”

Fonte: Com Seeb Brasília e CUT Nacional